Autorretratos de Agosto

Outro dia, falei de PBA aqui. PBA é a pesquisa baseada em arte, e uma de suas características mais empolgantes é acolher as opiniões e sugestões da plateia, focando mais no processo do que no resultado. Este ano, apresentei um instalação artística e duas fotocolagens no congresso da Consumer Culture Theory em Corvallis, nos EUA, que me deram imensa satisfação. As obras resultaram do projeto de pesquisa e extensão coordenado por mim na UFSJ, com o título Autorretratos de Agosto, em coautoria com Cadu, Chico Alessandri e John Schouten

Na pesquisa de campo, conduzida em Bichinho, MG, entrevistamos empreendedores sociais, com foco especial no Toti, proprietário da Oficina de Agosto. Entrevistamos ainda artistas que trabalham ou já trabalharam na Oficina. Para cinco deles, encomendamos um autorretrato tridimensional, uma escultura em que eles poderiam representar a si próprios como quisessem, com estética realista ou fantástica, inspirados por quaisquer aspectos de suas histórias de vida e identidades. Depois de prontas, usamos as esculturas durante entrevistas com seus autores, adotando a técnica projetiva do autodriving. Isto é: a escultura funcionava como uma terceira pessoa na qual eles podiam projetar suas visões de mundo, sem o constragimento de falar diretamente sobre si. Foi lindo usar a PBA para coletar dados de campo, numa expressão artística cocriada e comunitária, que dá ainda mais voz aos nossos entrevistados.

Aí chegou a hora de usar a PBA para interpretar dados e difundir achados. Mas como? Não queríamos simplesmente expor as cinco esculturas, uma ao lado da outra, como meros instrumentos de coleta de dados. Queríamos que a maneira de expô-las contasse algo mais sobre a pesquisa. Que o display, em si, também funcionasse como metáfora para alguma interpretação de campo, chave teórica, ou resultado de pesquisa.  Foi quando resolvemos incluir mais um grupo na conversa: a plateia. Então, do diálogo entre pesquisados, pesquisadores e observadores, surgiu o insight que resultou na exposição que mostrarei nos vídeos a sequir.

Os observadores convidados a opinar não poderiam ter sido mais generosos e competentes: a plateia do congresso GENMAC – Gender, Markets and Consumers, ocorrido em maio de 2022, em Estocolmo. Somos especialmente gratos a Susan Dobscha, Victoria Rodner e Jannsen Santanna, cujos comentários sobre nossa apresentação foram fundamentais para as decisões visuais e conceituais que tomamos posteriormente para o display dos autorretratos no congresso CCT – Consumer Culture Theory, ocorrido em julho de 2022, em Corvallis nos EUA.

Usamos o ex-voto como uma metáfora para a relação de gratidão entre os artistas da Oficina de Agosto e seu amigo/mentor/benfeitor/empregador Toti. Usamos o gazofilácio, visto nas “Salas dos Milagres” de igrejas católicas brasileiras, para, ao mesmo tempo, reconhecer as benfeitorias realizadas pelos empreendimentos sociais e criticar as relações trabalhistas capitalistas. A urna, que na igreja pede dinheiro, na nossa instalação pedia ainda mais comentários da plateia. Recebemos alguns emocionantes, ora falados, ora escritos. Um deles veio da própria Deborah Heisley, inventora do autodriving. =~)

Este projeto de pesquisa e extensão foi apoiado pelo Edital de Criação e Circulação Artística PROEX/UFSJ. Em minha última postagem, escrevi que jamais vi um centavo do dinheiro público para minha pesquisa em Administração. E é verdade. Mas felizmente trabalho em uma universidade federal que valoriza a arte.

 

Apresentação no congresso GENMAC, em maio de 2022, em Estocolmo

 

Self-Portraits in August: Recrafting Identity through Intimate Production in a Social Enterprise

 

Self-Portraits in August: Identities in Wood

 

Self-Portraits in August: Identities in Clay

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